terça-feira, 2 de agosto de 2011

CRIANÇA DA NOITE: APRENDIZADO


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CRIANÇA DA NOITE: APRENDIZADO

Por Lord Gafa

Minhas primeiras noites foram sombrias. Acompanhei ela em suas caças. Tinha que aprender como sobreviver, me alimentar.

Para ela tudo era como gado, mas eu tinha minha moral pequeno burguesa. Pegava só quem eu pensava que merecia.

Logo percebi que todos mereciam. Os indigentes eram mais fáceis, ninguém notava. Mas com o passar do tempo vi que eles aninhavam-se em pequenos grupos... Eram uma família de sem famílias. Comecei a compreendê-los. Mas continuava com reservas, talvez fruto de minha criação cristã e social, ou o que sobrava dela.

Mas eu estava apaixonada por ela. O temor já havia passado. Ainda me assombrava com algumas atitudes dela, mas começava a entender em que lugar da cadeia alimentar eu estava... No topo.

Depois de saciadas, voltávamos para nossa alcova; um de meus vários imóveis, nunca no mesmo, e fazíamos amor, trocávamos nossos sangues com leves e doces mordidas, nossos caninos passeavam por zonas que aprendemos mutuamente a nos proporcionar o máximo de prazer. Nossas peles gélidas arrepiavam-se a cada toque, sensíveis e às vezes mordazes. E próximo ao nascente, começávamos a nos entregar aos braços acalentadores de Morpheus.

Contudo, não era sempre assim. Muitas vezes ela ficava arredia, impaciente, calava-se e, como nada, desaparecia. Aprendi a não contar com sua presença constante. Meu espírito também clamava por seus momentos de liberdade. E eu, rebeldemente, a deixava, sem uma palavra, para vagar ao vento sobre minha Gold, presa somente aos meus pensamentos e devaneios, indo aos lugares que em vida eram somente sonhos de uma garota cheia de afazeres e deveres impostos pela sociedade.

Sem as atribulações de meu antigo cotidiano, minha percepção do mundo ganhou novo sentido. Livre dos grilhões sociais, sem classe, sem atributos, sem preconceitos, só respondendo a mim mesma pelos meus atos, passei a observar pequenas coisas, leves e singelos movimentos que ornam a vida dos seres viventes.

Eu era poderosa agora. Podia perceber mudanças de estado ou comportamento de qualquer ser, apenas vislumbrando as cores das auras ou dos chacras. Era forte. Rápida. O mundo passava a minha volta em slow motion. Nenhum movimento me escapava. Podia até antecipar certas reações, como que uma vidente.

Meu aprendizado estava fluindo mais rápido do que eu poderia pensar. Bastou me livrar de meus conceitos e preconceitos. Aceitar minha nova situação. Como uma borboleta se desprendendo de sua pulpa. Alçando vôo para o infinito e além.

Sabia que ainda existiriam barreiras, naturais, como o Sol e, sobrenaturais, como seres que só havia imaginado em fantasias infantis. Isso ainda tinha que aprender com ela. E não era tão simples. A sua maneira, ela soltava informações ao léu, por vezes parcialmente, como quem quer prender sua pupila, mantendo-a com curiosidade e vontade de absorver os conhecimentos, tratados como segredos, escritos em papiros empoeirados presos em uma tumba ainda não descoberta.

Muita coisa, entendi, eu mesma deveria descobrir. Dons que nos diferenciam, dando nossa individualidade, nossa proteção, fornecendo-nos capacidades diferenciadas para que possamos sobreviver em meio a uma miríade de seres competindo entre si pela eternidade.

Aprendi que a minha primeira e maior barreira seria aprender a lidar comigo mesma.

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